quarta-feira, 17 de junho de 2009

Os baianos já não são mais aqueles

RlO — Os baianos de Salvador, já não são mais aqueles radicais defensores da tradição da primeira Capital do Brasil, tão respeitados pelas autoridades que, muitas vezes bateram em retirada, dando última forma em decisões administrativas que iam contrariar a opinião popular.

Quem não se lembra da extraordinária campanha dos baianos em protesto a derrubada de uma frondosa árvore, na Praça Castro Alves, onde mais. tarde foi construído o prédio da "A. Tarde", na confluência das ruas Chile, Carlos Gomes e Castro Alves? Mais recentemente foi a reação contrária a substituição do calçamento irregular da Rua J.J. Seabra, a afamada Baixa do Sapateiro, por asfalto que, como a Sé, finalmente levou de vencida a população. Porém nestes dois casos o povo já não contava com os mais destacados líderes das décadas anteriores a 930.

Sabem o motivo que levou os baianos a protestarem e evitarem a derrubada da árvore do topo da Ladeira da Montanha? Nada mais nem rnenos devido ter sido sob as suas frondosas ramagens que o grande tribuno e intelectual, Ruy Barbosa, iniciou a sua campanha civilista, como candidato da oposição ao Marechal Hermes da Fonseca, á presidência da República, em 1910.

Os protestos valeram e a árvore não foi sacrificada e só desapareceu de velha. No mesmo local existe outra bastante crescida e conservada pela população

Naquela época tais reações eram normais, resultando, na maioria das vezes, em vitória do povo. Não só na Bahia mas em vários recantos do Brasil.

Aqui mesmo no Rio, certa vez, José Lopes Trovão liberou uma campanha popular, e venceu, contra uma decisão ao primeiro presidente da República de aumentar em 20 réis o preço das passagens. Posteriormente foram realizadas e com êxito campanhas contra a carestia, por destacados políticos tais como Maurício de Lacerda, Pedro Ernesto e tantos outras.

Hoje, infelizmente, não presenciamos tais reações em favor do povo que parece estar órfão, se limitando a, desencantado, ouvir Paes Mendonça, o representante dos super-mercados reagir contra a anunciada tentativa do Governo Federal de congelar os preços das utilidades por 60 dias.

Voltamos a impassividade dos baianos.

Há dias fiz uma rápida visita a Salvador, na qualidade de membro do Conselho Permanente dos Congressos dos Aposentados da Previdência e vi, desolado, a Lagoa do Abaete. Está completamente abandonada. As dunas que a circunda estão desaparecendo no mesmo ritmo da Lagoa, em beneficio de edificações íeitas sem prévios, estudos. O local está abandonado e até automóveis estão sendo lavados nas águas escuras, transformadas em verdadeiro charco.

Verifica-se, com certa estranheza, a desenvoltura das incorporadoras, que vão tomando conta de toda a cidade, sem respeitar a paisagem nem os mo­numentos .

Não podemos deixar de elogiar a ação das entidades imobiliárias em Salvador, desbravando áreas e construindo prédios mõdcrníssimos nos mais variados setorss da cidade, porém causa espécie como o governo deseja a orla marítima, em toda a sua extensão, ocupada por sofisticados hotéis em prejuízo da paisagem.

Os pequenos cabos existentes, que vão da cidade até Itapoan, estão tomados por uma incorporadora, feita de capitais nordestinos, segundo me informaram, A organização é responsável pelos «Hotéis Marte».

O prestigio da incorporadora é tão grande que os baianos temem que ela, dentro de pouco tempo, substitua o Farol da Barra e o Cristo, com mais grandes hotéis.

E os que assim pensam têm lá suas razões, pois os dois tradicionais monumentos ficam na principal área de ação da empresa que é em Ondina.


Rubens E Silva. Jornal da Manhã Ilhéus/BA 08/06/1979

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