RIO — Terminava de escrever "Minha Geração Está Desaparecendo" quando recebo uma carta de Belmonte, dando ciência de que a parede dos fundos da quase secular Igreja de Nossa Senhora do Carmo desabou e com ela o altar onde desde o fim do século passado reinava a Virgem de Carmelo que. por precaução, já havia sido retirada e transferida para a Capela de São Sebastião onde os atos religiosos em louvor a padroeira da cidade vinham sendo realizados.
Como faço todos os anos, estive em Belmonte em julho do ano passado, quando a Casa do Gerador, da iluminação da Igreja, havia sido destruída e, com ela, todo o maquinário, em virtude da última enchente do Jequitinhonha. A casa ficava contígua a parede desabada e as obras do cais que deveriam amparar não só o templo mas toda a cidade, bastante mutilada, seguiam em ritmos lentos e o material empregado na obra era motivo de severas críticas, por parte da população, inclusive por construtores, uma vez que as estacas de cimento armado- não vinham resistindo a pressão do bate-estaca.
Perde Belmonte, com o desabamento eminente da casa de orações talvez a última das construções vindas do século passado e que, na concepção dos católicos — que não são poucos — lídima guardiã da cidade, já que os avanços periódicos devido as enchentes do no, haviam parado a poucos metros da casa de Nossa Senhora do Carmo, que mantinha intocável pelo caudaloso Jequitinhonha, destruidor de mais de um terço da cidade, levando de roldão uma área de mais de três quilômetros, a partir do Freire até a Ilha das Vacas, destruindo o Cemitério velho, as "Aningas", o "Gravata", as barcaças secadoras de cacau do Maia e Olegário Matos, além das ruas dos Quartéis, da Ponte e metade da Marechal Deodoro do lado do Boquete, enquanto do outro lado, o Sítio de Albino era beneficiado com o crescimento de suas terras. A crença dos belmontenses era plenamente justificado pelo fato do rio ajudado pelo terreno arenoso ter produzido um vastão bolsão nos fundos da Igreja sem atingi-la, por maior que fosse o volume de água que recebesse o Jequitinhonha.
A igreja de Nossa Senhora do Carmo foi construída no outro período de 1895 e 1896, por iniciativa dos frades Capuchinhos Frei Paulino e Frei Caetano e sua planta elaborada pelo italiano radicado na cidade Etori Guerrieri, arquiteto, residente na Praça Dois de Julho (hoje Praça da Bandeira) por muito tempo Quartel General das Retretas da "15 de Setembro" — a Lyra Popular ficava na Praça 13 de Maio. Os executadores da obra foram os mestres Antônio Alexandrino Siqueira, Antônio Geraldo Cerqueira e José Rodolfo.
A primeira Igreja da Freguesia de Nossa Senhora do Carmo foi construída em 1776, com tijolos, dada a escassez de pedras nas imediações da antiga Vila, o mesmo acontecendo com o templo que a substituía. Os alicerces da nova casa de orações não tinham a profundidade e acabamento dos atuais, mas a estrutura das paredes e as amarrações firmavam a construção evitando possíveis desníveis de um terreno arenoso. Nos fundos da igreja foi feito um Cemitério que foi desativado anos depois devido as reclamações dos moradores das imediações, sendo então construído o já citado que com a destruição o município edificou outro nas imediações do farol.
Não tenho lembrança da existência em Belmonte de casas construídas no mesmo tempo da edificação da Igreja em pauta. Creio que na Rua Marechal Deodoro era onde existiam os mais velhos prédios da cidade como o de Teodoro Guimarães, de Professora Mãezinha e do senador Wenceslau Guimarães não mais existentes. Na mesma rua ainda existe a casa do falecido João Calabocorio, porém como lembrança dos velhos prédios existem os palacetes de Melo Poassú, Pascoal Camelier e Prefeitura Municipal. Poderíamos anotar nesta relação o palacete dos Brasões, não fosse o mau gosto dos diretores do Flamengo substituindo a bonita fachada do prédio em um inexpressivo "tapume" na principal rua da cidade •— a 15 de Novembro — que no próximo dia 23 de Maio, completará 90 anos de sua emancipação.
. Termino esta crônica, uma espécie de "Pró-Memória" fazendo um apelo aos poderes constituídos no sentido de ajudar Belmonte conter a fúria do Rio Jequitinhonha e evitar a sua destruição, devolvendo desta maneira; parte dos impostos arrecadados pela Federação.
Rubens E. Silva. Jornal da Manhã. Ilhéus. BA 09 Abr. 1980
quinta-feira, 9 de outubro de 2008
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