RIO — Foi em Agosto de 1925 que visitei, pela primeira vez, a histórica e centenária Porto Seguro, hoje transformada numa das maiores cidades turísticas do Brasil visitadíssima graças ao governo Federal que facilitou o acesso através de ótima estrada ligando a BR-101. Era, na época, um dos componentes da tradicional Lyra Popular, que, na ocasião, pela primeira vez ia abrilhantar as festividades em louvor a Nossa Senhora d’Ajuda, assistidas por milhares de romeiros dos mais variados recantos do Brasil.
A viagem foi no "russo canela" e as bem espichadas 18 "léguas de beiço” foram vencidas em dois alegres dias com uma interrupção, para dormida, em Santa Cruz, de onde parte da delegação resolveu fazer a última etapa enfrentando o mar em toscos batelões, contratados para transportar o instrumental da "banda belmontense". Viagem inesquecível pela alegria, pelos imprevistos e sobretudo, pelas brincadeiras tão naturais entre jovens que aproveitavam os descuidos dos veneráveis diretores para lhes aplicarem verdadeiras ciladas, numa espécie de "revanche" às repreensões e implacáveis marcações durante .os longos ensaios preparativos para as grandes tocatas. Antônio Alexandrino Siqueira, o Antônio de Astério, que chefiava a turma era o alvo de nós músicos. Como sofreu o velho dirigente naquela excursão.
Não me sai da lembrança a última etapa da viagem quando, depois de ligeira parada em frente ao Cruzeiro onde foi. celebrada a primeira missa, localizado entre Santa Cruz e Porto Seguro, avistamos a colina do Arraial d’Ajuda onde está plantada a igreja da tradicional santa. Todos vibraram pensando estar prestes a chegada a Porto Seguro. Estávamos no extremo de uma bonita enseada. Mas a proporção que íamos avançando em direção a centenária cidade ela ia se afastando como por encanto. O mais importante foi a renovação do ânimo que nos dava àquela silhueta. Finalmente depois de cerca de oito horas, chegamos a Porto Seguro onde fomos recepcionados por grande número de pessoas, entre os quais os companheiros dos batelões alguns dos quais arrependidos, desacostumados com a agitação do mar.
Foram quatro "dias de festas e homenagens a nossa filarmônica, culminante com um baile oferecido pelo juiz de direito. A festa animadíssima lá na Colina, distante da cidade alguns quilômetros, depois da travessia do Rio Buranhem. O pequeno arraial como que se elastece para comportar tanta gente durante os festejos religiosos, muitos dos quais, por falta de acomodação, ficaram sem dormir. A igreja ficava, durante a noite a disposição dos romeiros, já que as casas de pouso não davam conta do recado.
Me lembro quando, já em Porto Seguro, escalei o Alto de Nossa Senhora da Pena, onde abandonado, estava o marco do Descobrimento1 do Brasil, servindo até do mictório público.. A igreja permanecia fechada, já que a festa da dona da casa seria em setembro, por sina! uma festa e tanta, inclusive motivo de competição entre duas ruas da Porto Seguro. Na época procurei me aproximar de um velho morador e devoto de N S da Pena. Ele, no ano anterior havia localizado uma "peça" — canhão antiquado — de bronze encrustada no sopé do morro, o que deu mais ânimo e vitória da rua já por duas vezes vencida pela sua concorrente.
Achei por bem "puxar" pelo velho para saber algo mais de sua terra. Na conversa veio à tona a imagem da santa que não pude ver devido a igreja estar fechada. Me contou que há muitos anos passados, a imagem teria que ser "encarnada" — espécie de restauração — e a venerável irmandade resolveu escolher a moça mais bonita da cidade, para servir de modelo. Houve muita discussão com prós e contra, mas prevaleceu a vontade da maioria dos "irmãos'' e se processou a escolha daquela que seria a imagem de Nossa Senhora da Pena.
Era, de fato, uma belíssima moça, a escolhida que foi mandada para Bahia (Salvador) o um mês depois voltou acompanhando a santa. Porto Seguro em peso foi receber a nova imagem chegada às vésperas do dia da padroeira — 15 de Setembro.
.Depois daquela manifestação religiosa, uma notícia abalou a histórica Porto Seguro:
— Inexplicavelmente, a "modelo" que gozava de ótima saúde, havia morrido de repente.
Rubens E. Silva. Jornal da Manhã. Ilhéus/BA 14/01/1981
domingo, 12 de outubro de 2008
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